
Porém somente mais tarde eu vim a saber que aquelas grades eram resquícios de São Paulo antigo e que um dia o governo havia se insurgido contra elas. Mais uma vez o governo se metendo em coisas particulares, injustamente.
A história de São Paulo fala dessas lindas grades de madeira.
“Costumes que custaram a acabar”
Durante mais de trezentos anos existiram rótulas na Cidade de São Paulo. Aquele gradeado de madeira, com seu estilo árabe peninsular, escondeu muita coisa, principalmente o tímido amor das paulistanas. Um viajante francês de 1840 já se queixava: “têm-se a impressão de que se é espreitado por toda a parte; entretanto as ruas de São Paulo são quase desertas”. Referia-se, naturalmente, às indiscretas rótulas...
Haviam-nas em toda a parte, desde as casas pobres de taipa até os sobradões enfeitados de azulejos dos fazendeiros apatacados. Um dia, porém, em nome do progresso, resolveram derrubá-las e nasceu uma discussão terrível. uns a favor, outros contra. A polêmica saiu dos becos e foi para as colunas dos jornais. “O Constitucional”, em 21 de outubro de 1854, protestava assim:
“O Constitucional” noticiou que o sr. tenente-coronel Luz, solícito pelo bem da municipalidade, projetava, segundo se lhe informara, propor à deliberação da câmara da capital a necessidade de vedar a abertura das portas e janelas para a rua. Como tanto o bem como o mal neste mundo tem defensor, por isso já houve alguém a dizer que convinha não declarar guerra às pobres rótulas, que são muito cômodas: - cômodas em que sentido? para ocultarem-se as famílias, as vidraças cobertas com esteiras da China nas janelas baixas, como se pratica em Santos, no Rio de Janeiro, etc., produzem o mesmo efeito. e ocultarem-se de quê? Somos nós um povo de cucas! Demais, vai ai grave questão de moralidade: é bom refletir sobre o estímulo de tudo que se esconde. As pequenas povoações do nosso litoral, várias vilas e cidades do interior prescreveram as esteiras de palha, ou de pau dos seus edifícios; estamos nós mesmos adiantados, e a nossa moralidade é inferior à delas? De resto é fora de questão que muito melhora de aspecto a capital da província com a providência projetada, que os perigos das abalroadas nas janelas desaparecem; e quem sabe que influência exercerá nos nossos costumes?”
Passaram-se os tempos, e, apesar de tudo, continuaram as rótulas. Em fins de dezembro de 1873, eis que a câmara municipal tomava a deliberação de pôr-lhes um termo. um edital, publicado na imprensa local, dizia o seguinte:
“de ordem da Ilma. Câmara Municipal declaramos que o prazo improrrogável para a substituição de rótulas, postigos, cancelas, portas ou janelas de abrir para fora, finda-se em 31 do corrente mês; e, para que ninguém alegue ignorância, findo esse prazo, o infrator será multado em 5$000, e mais no de fazer a obra a sua custa. São Paulo, 22 de dezembro de 1873. O fiscal do distrito do norte, João Antonio de Azevedo. O fiscal do sul, Pedro Nolasco da Silva Fonseca”.
A 1o de janeiro de 1874, o “Diário de São Paulo”, na primeira coluna da primeira página, publicava a seguinte nota veementíssima:

Entretanto, com o passar dos anos, aos poucos, as rótulas foram saindo das janelas paulistanas. Em 1880, a maioria das casas já não usavam mais.
Fonte:
São Paulo de Nossos Avós - Raimundo de Menezes
Ilustrações de Belmonte, publicada no livro “Rotulas e Mantilhas” de Edmundo Amaral
OBS: Na foto acima, a casa de minha avó paterna com as rótulas. Minha avó Zilda no meio com suas duas irmãs Ismênia e Eduarda. O seu irmão Jorge não está na foto. O homem é marido da Eduarda e chamava-se: Francisco D'Assis Monteiro de Castro, vulgo "nene" (sub-delegado regional do Bairro do Belenzinho, Capital de São Paulo).
OBS: Na foto acima, a casa de minha avó paterna com as rótulas. Minha avó Zilda no meio com suas duas irmãs Ismênia e Eduarda. O seu irmão Jorge não está na foto. O homem é marido da Eduarda e chamava-se: Francisco D'Assis Monteiro de Castro, vulgo "nene" (sub-delegado regional do Bairro do Belenzinho, Capital de São Paulo).
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